Artur Jorge: Literatura, Filosofia e Poesia

Filed in Poleg'Artes by on February 22, 2024

Conheci pessoalmente Artur Jorge em 1990 quando estagiei “em casa”, isto é, na Escola Secundária Oliveira Martins, situada na zona das Antas, entretanto desactivada.
Decidi convidar não o treinador- nesta altura celebérrimo por ter conquistado a taça de campeões europeus ao serviço do FCP, o meu clube do coração -, mas o Poeta, com estudos em Filologia Germânica, a dialogar com os alunos sobre a sua Poesia.
Queria minar o preconceito de que os treinadores de futebol não podiam ser intelectuais, cultos e sensíveis às artes e à filosofia.
É claro que Artur Jorge já nesta época era um caso de excepcional sensibilidade.
Era o meu primeiro ano enquanto professora de Filosofia e surpreendentemente Artur Jorge aceitou o convite de uma professora totalmente desconhecida. Vivi este episódio por entre uma incredulidade e um frenesim constantes.
Artur Jorge entrou de limousine branca na escola. Nunca mais me esqueci desta entrada triunfal, digna de um protagonista de um filme de Wim Wenders, e creio que os alunos também não. De fato azul escuro e com o seu inconfundível bigode, foi rapidamente rodeado por alunos que lhe pediam autógrafos. O que estes desconheciam é que Artur Jorge estava prestes a oferecer-lhes, a oferecer-nos, uma bela lição de Poesia, declamando alguns dos seus poemas e defendendo o papel das artes na escola e a importância do estudo, do pensamento e da filosofia na procura do sentido da vida!

Um visionário.

©Lusa

6.
De
folhas
estateladas

a
árvore
corpo-
-só

de

junto aos despojos

5.
Parece uma chama
oscila

de oiro
sobre a boca
exígua

um sopro de vento
derramando a água
do poema

de encontro à página a arder

4.
De sons impercetíveis
as cordas vocais
a altura
o timbre
ao piano
suspensa

3.
Os dedos crescem pela água dentro
ao encontro dos ombros

2.
Breve
e temerário
o rosto exposto
ao luar

1.
Folhas cansadas
no fim das tardes de outono
a exemplar unidade
das mãos

então
as veias
rios de coragem
em perfeito movimento

ardem em sangue
roucas

doidas de ar puro. “

In Poemário, Correio do Porto, 17-08-21

Muito obrigada pela desmesurada generosidade Artur Jorge.

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